Na apresentação das delegações, flâmulas e bandeiras dão o ar de solenidade.
Na hora da competição, cada um quer ganhar do outro.
O sucesso dos CTGs, Centros de Tradições Gaúchas, tem pelo menos duas razões fundamentais.
A primeira é a qualidade do material de cultura resgatado pelo pioneiro Paixão Cortes e seus companheiros; as músicas, as danças e os costumes foram trazidos diretamente da memória do povo.
A segunda razão do êxito dos centros de tradição está na história da expansão de nossa agricultura nas últimas décadas. Só o avanço da agricultura explica a existência de CTGs no oeste da Bahia, em Minas Gerais, em todo o Centro-Oeste.
Os gaúchos saíram de seu estado atrás das possibilidades abertas pela domesticação do cerrado para a produção de grãos e junto com eles foi a tradição que, preservada, estava prontinha, saindo do forno.
A Fazenda Lajeado fica no município de São Francisco de Paula, no nordeste do Rio Grande do Sul.
É região dos campos de cima da serra, a 112 quilômetros de Porto Alegre. Os CTG estava agitado com a realização de provas de gado e de cavalo em um rodeio que reúne outros 36 ctgeiros da região.
São provas classificatórias para o torneio nacional.
O povo foi como pode e montou acampamento em barracas e tendas. A lona de circo reforça o espírito de festa.
Na apresentação das delegações, flâmulas e bandeiras dão o ar de solenidade. Na hora da competição, cada um quer ganhar do outro. Em uma das provas, o cavaleiro tem de receber a mensagem no chão.
Depois, monta e corre para passá-la ao outro. Às vezes, o cavalo estranha. A assistência é firme, solidária e variável.
A prova é feita nem que chova ou tenha muito barro. “Para ser sócio não é necessário morar na fazenda”, avisa Mauro Luís Bragheto, patrão do CTG. A prova do pealo consiste em laçar um animal pelas duas pernas.
Um rodeio precisa de 600 cabeças, mas está ficando difícil reunir o gado. O pecuarista empresta os animais cada vez com menor boa vontade. Por isso, há CTG que usa vaca de rodinha pelo menos nos treinamentos. Nas provas na Fazenda Lajeado, a lama espirra no tropé dos cavalos.
As mulheres dos CTGs são chamadas de prendas. Há sempre concurso entre elas. Conseguir a faixa de Primeira Prenda é o sonho de muitas participantes. Exige-se habilidade, graça e dote artístico.
A equipe de reportagem fez um teste com a estudante Juliana Pinheiro, de nove anos, candidata a Prenda Mirim sobre a Revolução Farroupilha ou Guerra dos Farrapos. Mas ela não soube responder direito.
A Revolução Farroupilha, que durou dez anos, foi um movimento do Rio Grande do Sul contra o governo imperial por causa do abandono. Chegou a ser proclamada a República de Piratini separada do Brasil. Mas Juliana se expressa de uma forma tão graciosa e agradável que fica sendo só uma questão de estudar um pouco mais para ser aprovada.
A estudante Ingrid Flores quer ser Primeira Prenda Juvenil. “Para ser Primeira Prenda, primeiro, precisa muita força de vontade, exige muito tempo e estudo. Eu acho que a beleza que conta é a que vem de dentro para fora e não de fora para dentro”, diz.
Os sócios do CTG são os peões. Também existem provas entre eles. Além da história dos gaúchos, de saber dançar e cantar, é preciso encilhar bem o cavalo. Ao misturar diversão e disputam, acontecem em todos os CTG campeonatos de ferradura e de argola.
A data mais importante para o CTG é 20 de setembro, culminando a Semana Farroupilha. Só no Rio Grande do Sul o pessoal coloca na rua uma cavalaria de 30 mil pessoas montadas. Tem festa e muitas bandeiras.
Em alguns CTGs há elementos diferentes, como a forma de cumprimento gaúcho ou uma palavra de ordem. A tabua de restrição às vezes é longa e sempre rigorosa. Existe até uma música de parabéns gaúcha para ser usada no lugar da canção de aniversário mais conhecida, que é a americana.
Há críticas para o nacionalismo gaúcho mesmo no Rio Grande do Sul. Uma delas é que o movimento romantiza o momento do passado como se nele não houvesse conflito.
Outra critica é que simplifica demais a base cultural do estado, como explica o historiador Tão Golin. “Na história do Rio Grande do Sul a gente compreende que a parte campeira, a parte do gauchismo, é apenas um dos aspectos da formação geral e complexa do Rio Grande do Sul”, esclarece o historiador.
O trabalho de resgate da cultura campeira gaúcha é muito respeitada. O gaiteiro Renato Borghetti, hoje um dos mais importantes músicos do Brasil, se considera um produto do CTG. “Eu comecei no CTG primeiro dançando e declamando.
Mas o que realmente começou a me chamar a atenção foi o som da gaita”, revela. Sempre que pode, Borghetti faz ensaio de sua banda navegando no barco de um amigo num afluente do Rio Guaíba, perto de Porto Alegre.
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